Equivocadamente, chamamos: Sábado de aleluia. Saiba por quê!
Com certeza você vai ouvir notícias relativas ao “sábado de aleluia” (sic), dentre as quais se destacam as brincadeiras populares dos “Judas” enforcados... “Sábado de aleluia” é o nome que costumam dar este dia. No entanto, em nenhum documento oficial da Igreja católica existe a expressão “sábado de aleluia”.
Daí vem a pergunta: Por que ainda se insiste no uso de tal expressão?
De onde vem “sábado de aleluia”?
Os cristãos, desde suas mais remontas origens, celebram a Páscoa (paixão, morte e ressurreição de Jesus) uma vez por semana. O domingo é o dia semanal da Páscoa dos cristãos. A partir do século II, as Igrejas cristãs passaram a celebrar a Páscoa também uma vez por ano, então com um destaque todo especial, a saber, mediante um tríduo sagrado, isto é, em três dias sucessivos:
- No 1º dia (sexta-feira, cujo início já se dá a partir do anoitecer da quinta-feira), celebram todo o sofrimento do Senhor e sua morte na cruz;
- No 2º dia (sábado, cujo início já se dá a partir ao anoitecer da sexta-feira), celebram o mistério do corpo do Senhor na sepultura, sua presença na região dos mortos;
- No 3º dia (domingo, cujo início já se dá ao anoitecer de sábado), celebram a ressurreição do Senhor dentre os mortos, mediante uma solene vigília pascal.
O sábado, portanto, segundo dia do tríduo pascal – que a Igreja chama de “sábado santo” –, celebra o repouso de Jesus no sepulcro, bem como sua descida ao mundo da morte, onde ele anuncia a libertação dos grilhões da morte a todos que esperavam pelo momento em que as portas do céu deviam se abrir, como ensina o apóstolo Pedro (1Pd 3,19-20; 4,6). É um dia de silêncio, de continuação do jejum, de recolhimento na paz e na espera. Sem festa, portanto. Sem “aleluia”! Mas, então, por que chamam esse dia de “sábado de aleluia?”
É que lá pelo século VII, anteciparam a celebração da Vigília Pascal da noite do sábado (já início do domingo, portanto!) para às 14h00 do sábado (sábado mesmo!). Posteriormente, a partir do século XVI, vemos a Vigília antecipada para mais cedo ainda, para as 9h00 da manhã do sábado. E veja que coisa estranha! Em plena manhã de sol, em pleno dia, o diácono cantava diante do círio pascal as “maravilhas desta noite santa” (às 9h00 da manhã!)! E em seguida, antes da proclamação do Evangelho, irrompia o solene canto pascal de “aleluia”. Daí que, equivocadamente, a linguagem popular passou a chamar esse dia (sábado santo) de “sábado de aleluia”. Por causa do canto de aleluia da “Vigília” antecipado para manhã do sábado, deturpando assim o mais original e tradicional sentido deste santo dia.
Essa prática vigorou até 1955, quando o papa Pio XII reformou o tríduo pascal e, posteriormente, a reforma do Concílio Vaticano II o confirmou, ou seja: Resgatou-se a Vigília pascal para o sábado santo à noite (=início do domingo), como era o costume dos primeiros séculos. E o sábado todo (da noite de sexta até à noite do dia seguinte) volta a ser considerado como dia da sepultura, dia do silêncio, dia de recolhimento, dia de luto, dia vazio, sem nenhuma celebração litúrgica (com exceção da Oração matutina da Liturgia das Horas) e sem “aleluia.”
Agora, veja que coisa interessante! O sentido original do sábado santo foi oficialmente resgatado, mas o equivocado nome de “sábado de aleluia” continua ainda agarrado no inconsciente coletivo ocidental e verbalizado, sobretudo, por ocasião da semana santa. Até quando?...
Bibliografia
ALIAGA, E. O segundo dia do tríduo pascal: o sábado santo. In: BOROBIO D. A celebração na Igreja 3: Ritmos e tempos da celebração. São Paulo: Loyola, p. 110-112.
BERGAMINI, A. Tríduo pascal [V. Sábado santo, segundo dia do tríduo]. In: SARTORE, D. & TRIACCA, A. M. Dicionário de Liturgia. São Paulo: Paulinas, p. 1200.
JOUNEL, P. O sábado santo. In: MARTIMORT, A. G. A Igreja em oração. Introdução à Liturgia IV: A Liturgia e o Tempo. Petrópolis: Vozes, 1992, p. 59-60.
NOCENT, A. O Sábado Santo. In: VV.AA. O ano litúrgico. História. Teologia. Celebração. São Paulo: Paulinas, 1991, p. 108. (Anámnesis 5).
Frei José Ariovaldo da Silva, ofm
Teólogo liturgista
12.04.2014